sexta-feira, março 28

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Categoria Opinião Noticia Atualizada em 26/12/2013 às 10:33:01
Os coronéis do seculo XXI
Naqueles tempos o voto era aberto no Brasil, assim, os coronéis mandavam capangas para os locais de votação, com o objetivo de intimidar os eleitores, com esse domínio os coronéis do passado ditavam os rumos políticos de suas localidades.

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A política de tempos em tempos produz fenômenos que fogem a regra, seja pelo poder econômico, pelo carisma ou pela popularidade, sempre há figuras que se sobressaem da maioria.Em um Brasil não muito distante, quem ditava as regras da política nos grotões do país era os “Coronéis”, que dominavam os chamados “Currais eleitorais”. Naqueles tempos o voto era aberto no Brasil, assim, os coronéis mandavam capangas para os locais de votação, com o objetivo de intimidar os eleitores, com esse domínio os coronéis do passado ditavam os rumos políticos de suas localidades.
Com as mudanças que o tempo impôs as práticas políticas, e a evolução natural do país, tanto no social como no econômico, a influência dos coronéis diminuiu, mas se prestarmos atenção nas lideranças que hoje dominam a política, podemos falar que são os novos coronéis da política do século XXI. Se analizarmos as principais lideranças iremos constatar verdadeiros aparatos que acabam influenciando grande parcela da população na hora do voto.
O que dizer da influência do ex presidente Lula sobre a máquina partidária do PT, seucontrole sobre vários sindicatos Brasil afora. Claro que Lula não chegou a esse patamar na base da violência, como era o caso dos antigos coronéis, conseguiu na base de seu poder de persuasão e no tino político que se destacou logo no inicio de sua carreira política no ABC Paulista. Além dessas estruturas o ex presidente conta com um grande time de jornalistas infiltrados nos grandes jornais do país, sem contar com a proliferação de sites e blogs que além de elogiar os feitos do ex presidente serve também para atacar seus adversários.
Seria incoerência falar de coronéis e não citar Antônio Carlos Magalhães, que dominou a Bahia por várias décadas. A influência de ACM na política baiana abrangia do Tribunal de Justiça aos gremios recreativos das universidades. Com tanto poder, ACM já chegou a eleger mais de oitenta por cento dos prefeitos e seu grupo é que ditavam as regras nas prefeituras.
Nessa turma também se encaixam os presidenciáveis Aécio Neves (PSDB), Eduardo Campos (PSB) e Paulo Hartung (PMDB), verdadeiros “coronéis” do século XXI. Aécio Neves montou uma estruturada assessoria de imprensa no decorrer de sua carreira e domina políticamente, desde 2002, o estado de Minas. Já o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, herdou um grande aparato do avô e com o instinto de uma raposa ampliou em vários quilometros seu diametros de influência. E o Espírito Santo também tem seus coronéis do século XXI e o seu maior representante atualmente é o ex governador Paulo Hartung que tem influência no Tribunal de Justiça e praticamente manda no Tribunal de contas, sem falar dos vários políticos que devem seus mandatos a Paulo Hartung.
Com tanta influência, para o bem ou para o mal, esses políticos decidem eleições. Estamos vivendo uma “Ditadura democrática”, onde o voto da maioria é decidido, ou influenciado, por questões subjetivas que muito das vezes foge do real significado de seu valor, contribuindo para se formar “Feudos” em várias cidades desse imenso Brasil. O voto, que deveria ser uma decisão pessoal, com o desejo de transformar para melhor o nosso país acaba sendo instrumento de perpetuação de poder de muitas “Raposas felpudas”, que habitam o mundo polítco brasileiro.
Fonte: O Autor
Por: Mário Moreira | Imprimir
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quinta-feira, março 20

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segunda-feira, 7 de junho de 2010

A SAÚDE MENTAL NA CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS

Revista Jurídica Consulex nº 320
Matéria de Capa
DivulgaçãoRenata Lira e Rafael Dias
RENATA LIRA é Advogada da Organização Não Governamental de Direitos Humanos Justiça Global.

RAFAEL DIAS é Pesquisador da Justiça Global e doutorando em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF).
Nos últimos 20 anos, foram visíveis as transformações na assistência de saúde mental e no cuidado dispensado às pessoas com transtorno mental, operadas pela Reforma Psiquiá­trica, a qual entendemos como um processo social complexo e inconcluso que envolve diversos atores da sociedade civil e agentes políticos dos três níveis de governo: municipal, estadual e federal.
Essas mudanças resultaram da luta dos trabalhadores da saúde, usuários dos serviços e seus familiares pelos direitos e garantias consagrados na Constituição de 1988 e, posteriormente, na legislação de regência do Sistema Único de Saúde (SUS), criado em 1990.
Um dos marcos do Movimento pela Reforma Psiquiátrica foi o II Congresso dos Trabalhadores de Saúde Mental (“Congresso de Bauru”), realizado em 1987, cujo lema “por uma sociedade sem manicômios” se constituiu uma crítica à assistência psiquiátrica de tipo manicomial. À época, o modelo adotado eram grandes hospitais psiquiátricos de característica asilar, que promoviam diversas formas de violações aos direitos humanos. Para Franco Basaglia1, idealizador da psiquiatria democrática italiana, a instituição manicomial está historicamente ligada à violência.
Para reverter tal situação, algumas medidas foram adotadas, como a apresentação do PL nº 3.657/89 pelo Deputado Federal Paulo Delgado2, visando romper com o modelo de “modernização” técnico-assistencial da psiquiatria, avançando para uma crítica mais global e complexa.
No plano internacional, o compromisso firmado pelo Brasil ao assinar a Declaração de Caracas (Venezuela), em 1990, impulsionou as reformas na área da saúde mental nas Américas.
No início da década de 90 foram abertos alguns Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), em São Paulo, e Núcleos de Atenção Psicossocial (NAPS), em Santos, com a finalidade de promover mudanças no modelo centrado no hospital psiquiátrico, para a atenção de base territorial e comunitária. No entanto, o crescimento dos serviços substitutivos aconteceu de maneira descontínua e sem financiamento específico do Ministério da Saúde, concentrando-se os recursos públicos nos hospitais psiquiátricos.3
Nessa trajetória, a aprovação da Lei nº 10.216/01 significou um novo impulso para a efetivação das políticas de atenção psicossocial de caráter aberto e com base comunitária.
A LEI DA REFORMA PSIQUIÁTRICA
Com a sanção da Lei nº 10.216/01 e a edição de portarias pelo Ministério da Saúde, a Reforma Psiquiátrica ganhou finalmente um marco legal e o caráter de política pública que, embora priorize a rede substitutiva de base comunitária na atenção à saúde mental, carece de mecanismos que assegurem a gradual substituição dos manicômios e a ampliação da rede extra-hospitalar.
É preciso frisar que a substituição gradual dos leitos em hospital psiquiátrico pela rede de cuidados intensivos não significa desassistência, e sim mudança de paradigma na atenção devida às pessoas com transtornos mentais, integrando-as em diferentes contextos sociais.
Atualmente, a rede extra-hospitalar ganha força. Dados recentes do Ministério da Saúde apontam para 1.502 CAPS cadastrados em todo o Brasil4 e o desenvolvimento dos Serviços Residenciais Terapêuticos (SRTs) com o Programa “De Volta para Casa”, direcionado às pessoas com longa permanência em hospital psiquiátrico, além de projetos para geração de renda, entre outros. Essas iniciativas conferem cidadania civil e política àqueles que necessitam de cuidados na rede de saúde mental.
Todavia, para a consolidação do projeto reformista, há que se colocar os CAPS III funcionando 24h diariamente, para atendimento dos casos de emergência, criar leitos psiquiátricos em hospitais gerais e conceder financiamento público para a ampliação dos dispositivos abertos de saúde mental, assim como para capacitação e remuneração digna dos profissionais.
Alguns anos antes da aprovação da Lei da Reforma Psiquiátrica, a morte violenta de Damião Ximenes dentro de uma instituição de saúde mental ensejou a condenação do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos.
O CASO XIMENES
Em 1º de outubro de 1999, Albertina Ximenes internou o filho, Damião Ximenes Lopes, na Casa de Repouso Guararapes, em Sobral-CE. Três dias mais tarde (04.10.99), retornou à clínica para visitá-lo, encontrando-o em estado lamentável, sangrando, com diversas escoriações e hematomas, sem roupa e com as mãos amarradas. O médico responsável, Francisco Ivo de Vasconcelos, então diretor da instituição e legista do Instituto Médico Legal, quando solicitado pela mãe do paciente, apenas prescreveu medicamentos, sem sequer examiná-lo. Horas depois Albertina foi informada da morte de Damião.
Irene Ximenes, irmã do paciente, registrou ocorrência na Delegacia de Polícia local, buscou por outras pessoas torturadas na mesma clínica e indicou a ausência de depoimentos cruciais para as investigações. Decepcionada com a inércia e ineficiência das autoridades brasileiras, em novembro de 1999, Irene encaminhou uma denuncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). Em parceria com a organização não governamental Justiça Global e a cooperação de movimentos antimanicomiais, o Estado brasileiro foi denunciado, pela primeira vez, em uma instância internacional pela morte de paciente em clínica psiquiátrica conveniada com o SUS.
Em 4 de julho de 20065, numa decisão histórica, a Corte Interamericana de Direitos Humanos proferiu a primeira sentença condenatória envolvendo pacientes psiquiátricos no Sistema Interamericano de Proteção de Direitos Humanos, com manifestação acerca do mérito, reparações e custas. Assentou a Corte que o Brasil é responsável pela morte violenta de Damião Ximenes Lopes e também pelas violações a que estão submetidos seus familiares, que até a presente data aguardam por justiça.
Como forma de reparação, a Corte determinou ao Estado brasileiro o pagamento de indenização aos familiares de Damião Ximenes. E mais: a conclusão, em prazo razoável, do processo destinado a investigar e sancionar os responsáveis pelos fatos ocorridos, com os
devidos efeitos; a publicação, no prazo de seis meses, da sentença no Diário Oficial ou jornal de circulação nacional, e, ainda, o prosseguimento do programa estatal de formação e capacitação dos profissionais que atuam na área da saúde mental, com observância dos princípios que devem reger o trato das pessoas portadoras de transtorno mental, de conformidade com os padrões internacionais.
Em que pese o Estado brasileiro ter cumprido os pontos referentes à publicação de parte da sentença e ao pagamento de indenização, tem-se como parcial o cumprimento da sentença exarada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, pois, no entender de familiares e dos peticionários, a determinação de conclusão do processo em prazo razoável e o desenvolvimento de políticas públicas na área da saúde mental não foi respeitada.
Evidentemente, não se pode negar os avanços na área da saúde mental, contudo, há que se ressaltar a importância de celeridade na implementação das políticas públicas. É preocupante a convivência dos serviços substitutivos com os hospitais psiquiátricos de característica asilar, que, sem fiscalização, continuam a promover violações sistemáticas dos direitos humanos, numa repetição trágica dos fatos ocorridos com Damião Ximenes.
É o que ocorreu com Ana Carolina Cordovil Heiderich Silva, uma jovem de 18 anos que foi internada na Clínica de Repouso Santa Izabel, localizada em Cachoeiro de Itapemirim-ES, no dia 26 de novembro de 2006. Portadora de alergias, principalmente ao medicamento Haloperidol, conforme comunicou sua mãe ao médico assistente, a paciente recebeu tal medicação durante todo o período da internação, ou seja, até 04.12.06, o que sugere mais um caso de negligência médica e maus-tratos.
Ainda a propósito do caso Ximenes, é possível afirmar o descumprimento da determinação de que as ações em curso no Brasil fossem finalizadas em prazo razoável. Isto porque Damião foi morto em 4 de outubro de 1999, na Clínica de Repouso Guararapes; 1º de outubro de 2004, a Comissão informou ao Estado brasileiro que enviou o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos; 30 de novembro de 2005, realizada audiência na sede da Corte, em San José, Costa Rica, oportunidade em que o Brasil reconheceu sua responsabilidade no caso; 17 de agosto de 2006, o Estado brasileiro tomou conhecimento da sentença; 27 de junho de 2008, data da prolação da sentença na ação cível; 29 de junho de 2009, data em que prolatada a sentença no processo criminal; 6 de maio de 2010, quase 11 (onze) anos depois da morte de Damião Ximenes ainda não há uma resposta final para a sua família.
A condenação do Estado brasileiro na Corte Interamericana de Direitos Humanos, pelas violações cometidas contra Damião Ximenes e sua família, é um marco na luta pela reforma psiquiátrica no Brasil. Agora, o processo de reforma será novamente avaliado na IV Conferência Nacional de Saúde Mental, marcada para os próximos meses, a qual se configura um passo importante para garantir a ampliação da rede de cuidados e os direitos das pessoas com transtorno mental.
NOTAS
1 Basaglia esteve à frente da reforma da assistência psiquiátrica na cidade de Trieste (Itália), que inspirou o processo reformista brasileiro.

2 Esse projeto de lei seria aprovado 12 anos depois, com modificações.

3 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde.DAPE. Coordenação Geral de Saúde Mental. Reforma Psiquiátrica e Política de Saúde Mental no Brasil. Documento apresentado à Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas. OPAS. Brasília, novembro de 2005.

4 Ver em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/caps_dados_atualizados5abril.pdf. Acesso: 06.05.10.

5 Corte IDH. Caso Ximenes Lopes vs. Brasil. Mérito, Reparações e Custas. Sentença de 4 de julho de 2006. Serie C nº 149. Disponível em: http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_149_por.pdf.
http://profbadaro.blogspot.com.br/2010/06/saude-mental-na-corte-interamericana-de.html

domingo, março 9

 
                                           A crise existencial gerada 
                                       pelo fim do espetáculo da vida.

A morte física faz parte do ciclo natural da vida, mas a morte da consciência. humana é inaceitável. Só a aceitam aqueles que nunca refletiram minimamente sobra a sua consequências psicológicas e filosóficas, ou aqueles que nunca sofreram a dor indescritível da perda de alguém que se ama.
É aceitável o caos que desorganiza e reorganiza a matéria. Tudo no universo organiza, desorganiza e reorganiza-se novamente. Todavia, para o ser humano pensante, a morte estanca o show da vida, produzindo a mais grave crise existencial de sua história. A vida física morre e se descaracteriza, mas a vida psicológica clama pela continuidade da existência... Augusto Cury

domingo, março 2


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A financeirização da saúde. Entrevista especial com Luiz Vianna Sobrinho

“A saúde movimenta uma parcela considerável da economia mundial. (...) Ora, essa grande indústria pode ser de medicamentos, de marca-passo, de prótese de quadril, de pinças cirúrgicas, de cateter urinário, de máquinas de tomografia. O que se quer é que se consuma o quanto mais”, afirma o médico.
Foto: Dicas Free
A medicina exercida nas últimas décadas pode ser definida como “gestão contábil da saúde”. É a partir dessa ótica que o médico Luiz Vianna Sobrinho, autor do livro Medicina Financeira: a ética estilhaçada (Rio de Janeiro: Garamond, 2013), chama a atenção para a “mercantilização” da saúde no Brasil. “Médicos são acompanhados por seu desempenho pelas operadoras de planos de saúde, os hospitais idem e, assim, os pacientes também. Seus riscos, antes mesmo de surgir qualquer doença, são acompanhados e ‘tratados’. (...) Pacientes são negociados em carteiras, como ações. Patologias são precificadas como commodities. E a medicina baseada em evidência é que vem em busca de dar certificação a esse mercado”, denuncia o médico, em entrevista concedida à IHU On-Line por e-mail.
Vianna Sobrinho ressalta que, durante os governos Collor e Fernando Henrique, a saúde deixou de ser uma “atividade essencial do Estado” e foi entregue à iniciativa privada. “Ainda não houve um retorno dessa política em outro sentido. Logo, o que o Estado vem fazendo com o SUS é quase que o colocando como um apanágio para quem não consegue pertencer ao mercado de saúde”, lamenta.
O médico também comenta temas polêmicos que estiveram em pauta no último ano, como a luta pela Lei do Ato Médico e o Programa Mais Médicos. Para ele, a vinda de médicos estrangeiros para o Brasil tenta solucionar uma “crise aguda” na área da saúde. Trata-se de “uma grande vitrine em ano eleitoral, mas talvez se torne uma grande vidraça, como já começamos a perceber. Há inúmeros pontos frágeis, e o resultado a longo prazo me parece muito incerto”, pontua.
Luiz Vianna Sobrinho é médico cardiologista.
Foto: O Dia
Confira a entrevista.
IHU On-Line - É possível traçar um perfil do exercício da medicina no Brasil?
Luiz Vianna Sobrinho - Eu penso que sim, como uma caricatura. A medicina ‘tupiniquim’ guarda algumas semelhanças com outras questões nacionais, como a educação ou distribuição de renda. Há imensos contrastes, e essa talvez seja a sua marca. Acho que teríamos um perfil mais uniforme se fôssemos falar da medicina inglesa, francesa, portuguesa ou chilena. De uma forma geral, sabemos que a educação médica no Brasil tenta se espelhar na medicina norte-americana. A prática profissional tenta seguir os mesmos preceitos daquela prática liberal; o grupo da saúde pública bebe de outras fontes, do modelo inglês e francês, principalmente. Mas a variedade de práticas que vemos no nosso território é muito grande. Penso sempre na imagem do ‘Ornitorrinco’, do sociólogo Chico de Oliveira. Numa mesma cidade, como o Rio de Janeiro, por exemplo, circulamos entre mundos diferentes todo o tempo; a poucos quilômetros um do outro, às vezes na distância de algumas quadras. O que mais me espanta, no entanto, é que o médico também se metamorfoseia e muda sua relação com o paciente, enquanto ‘pula’ entre este ou aquele serviço, entre o público e o privado.
IHU On-Line - Por que as condições de saúde no Brasil são precárias? O que isso significa em termos de atendimento médico, tratamentos, atenção à saúde? Essa precarização da qual o senhor fala se estende a toda a medicina?
Luiz Vianna Sobrinho - O tema saúde é muito amplo. É político, é sociológico. Eu fiz um corte nesse tema e busquei olhar para a medicina, dentro deste momento da nossa história. Assim, as condições de saúde são precárias na mesma proporção e regionalidade que as condições sociais totais também o são. Temos o melhor hospital da América Latina e locais que precisam do Programa Mais Médicos. Somos um dos líderes mundiais em rankings de desigualdades.
IHU On-Line - Quais as principais mudanças evidenciadas na atividade médica nos últimos anos e a que atribui tais transformações?
Luiz Vianna Sobrinho - Aqui eu teria que fazer um resumo rápido de todo o meu livro. Então, com relação à atividade médica, eu diria que há duas ou três décadas a explosão da tecnologia era a grande mudança na área médica e também o que mais influenciava a relação entre o médico e o paciente. Nas últimas décadas, a explosão foi da informação e da sua assimilação pelo mundo da gestão, da burocracia, do controle financeiro pelo mercado da atividade médica. Esse é o tema do meu livro.

“Médicos que vendem seus serviços como um objeto de consumo a ‘clientes’ tendem a se comportar dessa forma”

IHU On-Line - Em seu livro, utiliza o termo “desatenção cortês”. Por que essa parece ser uma das principais características dos médicos?
Luiz Vianna Sobrinho - É uma expressão do sociólogo Erving Goffman, uma caracterização da ambiguidade do atendimento nos nossos tempos, em que se busca dar confiabilidade ao contato, mas, ao mesmo tempo, afastando-se de uma relação de maior intimidade. É a situação em que diríamos: “me atendeu de forma burocrática”. Os médicos que vendem seus serviços como um objeto de consumo a ‘clientes’ tendem a se comportar dessa forma. Diferentemente daqueles que permanecem com o entendimento de um paradoxo para o qual nos chama a atenção o filósofo Paul Ricoeur — de que embora a medicina tenha um preço e custos para a sociedade, a pessoa não é uma mercadoria e a medicina não pode ser um comércio.
IHU On-Line - O que senhor entende por medicina financeira? Que modelo de medicina existe em contraposição a essa?
Luiz Vianna Sobrinho - É a medicina que estamos percebendo nas últimas décadas. Poderíamos falar do biopoder, como em Foucault e Agamben, mas essa questão não é novidade, vem de muito tempo. Atualmente, prefiro a expressão do Gaulejac, de “gestão contábil da saúde”. Hoje, é mais disso que se trata. Médicos são acompanhados por seu desempenho pelas operadoras de planos de saúde, os hospitais idem e, assim, os pacientes também. Seus riscos, antes mesmo de surgir qualquer doença, são acompanhados e “tratados”. A bioestatística é utilizada como um instrumento de avaliação e seleção de populações, seja para intervenção terapêutica, seja para contratação de seguros. Pacientes são negociados em carteiras, como ações. Patologias são precificadas como commodities. E a medicina baseada em evidência é que vem em busca de dar certificação a esse mercado.
Penso que exista ainda muita prática de uma medicina mais sábia, voltada ao indivíduo de cada atendimento.
IHU On-Line - Em que consiste o paradoxo no Complexo Econômico-Industrial da Saúde?
Luiz Vianna Sobrinho - A saúde movimenta uma parcela considerável da economia mundial. Podemos pensar que na ponta final desse processo está um paciente que utiliza algum insumo prescrito ou indicado por um profissional da saúde, que pode ser um médico. Ora, essa grande indústria pode ser de medicamentos, de marca-passo, de prótese de quadril, de pinças cirúrgicas, de cateter urinário, de máquinas de tomografia. O que se quer é que se consuma o quanto mais. Os hospitais são um dos principais pontos de venda. Mas a ascensão do financiamento privado da saúde por meio dos planos e seguros trouxe um contraponto a esse consumo. O interesse aqui é na contenção do consumo, nas medidas de controle. E o mercado se equilibra, ou não, nessa disputa de consumo e controle. É notória a compra de ações da indústria farmacêutica americana pelos mesmos grupos financeiros que controlam os maiores seguros de saúde; tal concentração e onipresença é típica do capitalismo financeiro.
IHU On-Line - Qual a relação entre a indústria farmacêutica e a atuação médica no Brasil?
Luiz Vianna Sobrinho - No início de 2012 o Conselho Federal de Medicina iniciou uma maior regulação da premiação dos médicos a partir de suas prescrições em receituário; após um certo recuo, acabou deixando brechas. Na prática, penso que pouco mudou. Ainda são frequentes as viagens, inscrições e passagens para congressos, almoços, etc. A prescrição de medicamentos com princípios já conhecidos, mas sob novo nome, é um dos grandes engodos já comprovados. No entanto, hoje, o pagamento em dinheiro é mais escandaloso e frequente na área de insumos, como próteses e outros materiais de alto custo. Aí a coisa fica mais séria e rentável. É em dinheiro. São somas mais vultosas.

“Embora a medicina tenha um preço e custos para a sociedade, a pessoa não é uma mercadoria e a medicina não pode ser um comércio”

IHU On-Line - Em seu livro, o senhor faz uma crítica à omissão da publicação de resultados de certas pesquisas médicas que não favoreçam determinado medicamento ou droga analisada, além da interferência de empresas farmacêuticas em resultados de pesquisas que favorecem a utilização de determinadas drogas. Como e por que ocorre esse processo? Trata-se de uma prática mundial? Pode mencionar algum exemplo?
Luiz Vianna Sobrinho - A crítica foi feita, com ampla divulgação, pela Dra. Marcia Angell, da Universidade de Harvard, que durante mais de uma década foi do corpo editorial da mais antiga e prestigiada revista de medicina clínica do mundo, The New England Journal of Medicine. Ela estava no centro do mundo da divulgação de pesquisas na área médica. No livro A verdade sobre os laboratórios farmacêuticos, lançado no Brasil em 2007, ela disseca toda a força e poder dessa indústria nos Estados Unidos. No meu texto eu faço apenas um pequeno resumo, onde percebemos que o processo se inicia na pesquisa, nas universidades; atravessa os ajustes na regulamentação da FDA (a agência de controle de medicamentos nos EUA); penetra nos políticos do Congresso; envolve os médicos e, por fim, a grande mídia, onde circulam livremente as propagandas de drogas e terapias. O exemplo mais famoso e recente foi o do mundialmente conhecido anti-inflamatório Vioxx®, que foi comercializado por algum tempo, mesmo após vários alertas de seu risco de aumentar as mortes por infarto. Até mesmo a FDA esteve sob suspeita de envolvimento no evento. Era um líder de mercado, com vendas mundiais na casa dos bilhões de dólares. Acabou sendo proibido e restaram muitos processos e indenizações.
IHU On-Line - As políticas de saúde do Estado brasileiro em relação ao SUS e aos planos de saúde são consideradas antagônicas?
Luiz Vianna Sobrinho - Não me parecem. Ao contrário, todo o crescimento do segmento privado de seguros e planos de saúde se deu no espaço deixado pelo Estado, com a redução do investimento em sua rede de hospitais desde a década de 1980 e o subfinanciamento do SUS, a partir da década de 1990. Sob o comando dos governos Collor e Fernando Henrique, retirou-se a saúde como atividade essencial do Estado, que, segundo a cartilha neoliberal do ministro Bresser Pereira, deveria ser entregue à iniciativa privada. Caberia ao Estado apenas regular o mercado e fiscalizar a compra de serviços. Ainda não houve um retorno dessa política em outro sentido. Logo, o que o Estado vem fazendo com o SUS é quase que o colocando como um apanágio para quem não consegue pertencer ao mercado de saúde.
IHU On-Line - Concorda que há uma articulação do governo federal com o setor de planos de saúde por meio da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, a qual fortalece os planos de saúde e enfraquece o SUS?
Luiz Vianna Sobrinho - Não vejo dessa maneira. Podemos criticar a Agência por outras questões, talvez, pelo estímulo à concentração em grandes grupos, por privilégios em avaliações, salvamentos suspeitos de alguns planos. Mas a opção federal de não fortalecer o SUS me parece anterior e continuada, justamente com o subfinanciamento do sistema público. E isso é obra de todo o governo, das forças que comandam o Congresso, principalmente. A agência foi criada para regular o mercado de saúde privada, que existe e está crescendo. Podemos dizer que a política de saúde da última década estimulou esse modelo. E isso não é uma crítica de oposição, mas de insatisfação de todos que pensam em saúde pública. Ela pode ser vista no próprio livro organizado pelo insuspeito Emir Sader, lançado em 2013, com um balanço dos dez anos de governo do PT — Lula e Dilma, dez anos de governos pós-neoliberais no Brasil. O capítulo sobre a saúde, escrito pela professora Ana Maria Costa, é o mais crítico, de maior descontentamento.
IHU On-Line - Qual sua posição em relação ao Ato Médico?
Luiz Vianna Sobrinho - A medicina não é dos médicos. É da cultura da sociedade. Penso que, antes de qualquer coisa ou detalhe, o que está se discutindo são demarcações de poder. É uma briga de corporações profissionais. Ninguém está realmente olhando o problema do ponto de vista do paciente. Parece-me mais uma disputa de sindicatos. O texto traz demarcações que me parecem hilárias, como os limites de derme e epiderme para a atuação deste ou daquele profissional, mas permitindo as injeções e cateterizações que o médico já “deixa” que outros façam. O Estado tem de pensar na saúde de todos e deve ser orientado pela necessidade da terapia e da capacitação técnica para oferecê-la. O que eu temo é que seja o deus-mercado quem demarque esses limites, pela questão do custo do profissional.
IHU On-Line - Como avalia o Programa Mais Médicos implementado no país?
Luiz Vianna Sobrinho - Com estranhamento, desde o início. No começo de 2013, a maior “novidade” do governo federal na saúde foi a sinalização de um novo pacote de isenção fiscal para grandes planos de saúde de mercado, que assumiriam, com modelos mais baratos de assistência, os 40 ou 50 milhões de pessoas que estavam “entrando” no mercado de consumo, saindo da linha da pobreza. Então, parecia assim: a casa própria, eletrodomésticos de linha branca, telefones celulares e... plano de saúde. O ministro da saúde, à época já lançado como candidato ao governo do estado de São Paulo, reuniu-se com diretores do grupo Amil e Qualicorp e a notícia veio a público, mobilizando forte reação dos sanitaristas e entidades de saúde coletiva, como a Abrasco [Associação Brasileira de Saúde Coletiva] e o Cebes [Centro Brasileiro de Estudos de Saúde]. O governo recuou publicamente. Por sua vez, as entidades de defesa e regulamentação da atividade médica no país permaneciam no combate diário pelo reajuste na tabela de remuneração e honorários dos planos de saúde e na luta pela Lei do Ato Médico. Onde estavam as prioridades dos outros três quartos da nação sem plano de saúde?
Bem, após as manifestações que dividiram o ano em dois, parece que mudamos um pouco de país e de prioridades. O governo anuncia um programa com características de uma solução de crise aguda. Em um país continental, com 200 milhões de habitantes e quase 400 mil médicos, que comprovadamente tem um dos menores gastos públicos per capita com saúde na América (gastamos menos que Argentina, Chile, México e Colômbia e muito menos que Cuba, Canadá e EUA), o governo contrata uma “força-tarefa” de médicos estrangeiros, por um tempo determinado. Sob um regime trabalhista diferenciado, com violação das normas da prática da profissão no país, e uma postura litigiosa e de afastamento em relação às entidades oficiais e legítimas da prática da medicina no país. Será uma grande vitrine em ano eleitoral, mas talvez se torne uma grande vidraça, como já começamos a perceber. Há inúmeros pontos frágeis, e o resultado a longo prazo me parece muito incerto.
IHU On-Line - Como vê a medida do Estado brasileiro de exigir que médicos formados a partir de 2015 sejam obrigados a atuar durante dois anos no SUS?
Luiz Vianna Sobrinho - Acho coerente que isso aconteça com as faculdades e universidades públicas. O Estado tem o dever de planejar e distribuir os profissionais que são formados com o esforço conjunto da sociedade. Isso já deveria ser assim há mais tempo. O que vemos hoje são as titulações das melhores instituições públicas estampadas nos receituários dos consultórios privados, assim como a dupla, tripla vinculação e chefia de serviços públicos e privados simultaneamente.
(Por Patricia Fachin
http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/528158-a-financeirizacao-da-saude-entrevista-especial-com-luiz-vianna-sobrinho-